Ruan D'Ornellas

Cíclico

19/10/2017

Cíclico

Na sua pesquisa para esta exposição, Ruan D’Ornellas debruçou-se sobre a História da Beleza e a História da Feiura do escritor, filósofo, semiólogo, linguista e bibliófilo Umberto Eco. Deparou-se com a conclusão do autor de que “o que é belo ou feio é relativo aos olhos de quem os vê”.

 

Em Natureza morta em decomposição e Inevitável D’Ornellas ensaia o que, aparentemente, seriam soluções para parâmetros da beleza e da feiura. Uma saída tão incerta para o espectador quanto o nosso estar no mundo. Em vez de respostas prontas, o artista, na sua fala pictórica, prefere tensionar os limites dicotômicos, ampliando as possibilidades.

 

A distensão do real é uma das especialidades de D’Ornellas. Por isso, sua investigação passa pelas cartas do tarot. Não, mais uma vez, em busca de respostas circunscritas, mas para passear com as incertezas por seu apreço pelo transitório, borrando e desfazendo limites. Em Cíclico, o artista revela três cartas simbolicamente representadas pelo desenho Início meio fim, meio início meio fim – nele a junção das cartas de arcanos maiores: o Sol, a Lua e a Morte.

 

O Sol – o brilho, a glória e o sucesso – está associada à estrela do sistema solar, fonte de luz, como figura totêmica de calor e de vida; a Lua – os mistérios, a intuição, a noite, as sombras –

é a pura essência feminina; e a morte, que nada mais é do que o fim, a transformação, e, portanto a renovação. Uma triangulação quase resolutiva aos males físicos e morais, como quando os alquimistas extasiavam aqueles que buscavam compreender a obra alquímica, iludindo e atemorizando a alma humana em busca de respostas para o elixir da vida e pelo ouro.

 

Na sua transliteração simbólica, Ruan D’Ornellas submete os símbolos para se apropriar das suas dicotomias. É então neste momento que se aproxima dos polos (Yin & Yang), onde o movimento se torna o mesmo, porém, com um deslocamento menor. Quer nos dizer que somos dependentes da transitoriedade. Resta-nos a essência.

 

Na contemporaneidade, em que o diálogo estabelecido pela arte está em julgamento, conflitos, crises e descontentamento, o compartilhamento da subjetividade é oportunidade de comunicar o que não é dito, criando um território poético autoral coletivo. Ruan busca de forma onírica, mas com um sussurro claro, revelar o que nos é importante diante dos tempos e ruídos difíceis que atravessamos.

Cíclico favorece a latência e potência dos símbolos e dos signos do discurso do artista, desnudando a forma humana para o encontro da essência. Não nos interessa a censura ou o forjamento de pensamentos equivocados cheios de apontamentos oblíquos e desatualizados. Para Ruan (e para a arte) a psique está no jogo poético. A fantasia, o mito, o sonho, a imaginação são elementos essenciais ao exercício artístico, um pré-requisito.

Diego Martins

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